Classe Média fez cortes no orçamento para se adequar à nova realidade de preços
Engana-se quem acredita que o consumo em baixa é suficiente para segurar novas pressões sobre o bolso das famílias, já envolvidas numa engenharia de cortes de gastos da alimentação aos serviços pessoais para driblar a inflação mais alta. Da mesma forma, a elevação do dólar interfere diretamente nas viagens ao exterior, nos preços de produtos importados e intercâmbios. Setores como panificação e massas, indústria de transformação e segmentos como bares e restaurantes não terão como escapar do dragão e já planejam repasses de preços a partir de abril. O Relatório Focus, com as perspectivas do mercado, divulgado ontem pelo Banco Central, confirma que o aperto deve piorar e já estima inflação de 8,12% para 2015, maior patamar desde 2003, quando o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atingiu 9,3%.
As indústrias de panificação e de massas planejam repassar em abril pelo menos parte do aumento do custo de produção provocado pela elevação do dólar, que encarece o trigo cotado no mercado internacional, e pelo avanço das tarifas de energia. As padarias estão trabalhando nas planilhas para definir o reajuste dos preços do pãozinho de sal e demais itens feitos à base de farinha de trigo, que é faturada nos moinhos com o acréscimo da alta recente da moeda norte-americana. O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Panificação e Confeitaria(Abip), José Batista de Oliveira, afirmou, ontem, que o repasse é inevitável, ante os impactos da expressiva variação do dólar, que avançou de R$ 2,60 em janeiro para R$ 3,30 na semana passada, e a energia que aquece os fornos 60% mais cara. “Os empresários do setor estão trabalhando nas planilhas para repassar o mínimo possível. O que a gente gostaria era de trabalhar para aumentar o consumo de pães, e não o contrário”, disse.
A farinha de trigo responde por um terço do custo de fabricação do pão e a energia representa 14% do total. José Batista de Oliveira diz que prefere não arriscar uma estimativa dos reajustes ao consumidor, tendo em vista que os cálculos estão sendo feitos, inclusive pela indústria de moagem do trigo. Os fabricantes de biscoitos e bolos industrializados cogitam repassar 8% de aumento, em média, devido às mesmas pressões de custos, admitiu recentemente o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Biscoitos, Massas Alimentícias, Pães e Bolos Industrializados (Abimapi), Cláudio Zanão.
A perspectiva de repassar as despesas maiores não é diferente em outros segmentos da indústria de transformação. O presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Paulo Pedrosa, diz que o repasse de custos tanto aos consumidores finais quanto a outras indústrias deixa as empresas vulneráveis frente a seus competidores estrangeiros, agora beneficiados pela queda dos preços do petróleo e do gás natural. “Nos casos em que o repasse para os preços é inevitável, a indústria tende a reduzir suas margens, o que pode implicar em prejuízos e redução de investimentos produtivos”, avalia Pedrosa.
SEM COMPENSAÇÕES Até mesmo a proteção representada pelo dólar mais alto a alguns segmentos da indústria nas exportações de seus produtos pode não ser suficiente para evitar aumento de preços, observa o gerente de economia e finanças da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Guilherme Veloso Leão. “A tendência natural é de redução das margens e de adoção de medidas para melhorar a produtividade, mas essa estratégia fica difícil devido à baixa produção”, afirma.
O Índice de Preços ao Produtor da indústria de transformação subiu 2,86% nos últimos 12 meses até janeiro, enquanto o indicador da inflação oficial do país – o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – evoluiu 7,70% em 12 meses até fevereiro, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A disparidade entre os dois indicadores é sinal de que a indústria não conseguiu descarregar o aumento dos custos aos preços, ou seja, novos reajustes deverão ser aplicados. A conta dos bares e restaurantes também não deve se esquivar da alta dos preços dos alimentos, da sazonalidade dos hortifrutigranjeiros, e do reajuste da folha. O presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes de Minas Gerais (Sindhorb-MG), Paulo César Pedrosa diz que apesar de não haver clima para repasse de preços, o segmento já está com as despesas potencialmente altas e terá que repassar preços ao consumidor. “Os custos das carnes e das bebidas estão crescendo de forma generalizada. Em julho teremos a data-base e o custo da mão de obra vai ser reajustado.”
Como a inflação é para todos, diante da pressão de custos a família da dentista Mônica de Carvalho Martins Marques, de 55 anos, com renda acima de R$ 20 mil, já sofre os efeitos da economia brasileira. Mônica conta que se assusta todas as vezes que vai ao supermercado e se depara com preços diferentes. “Está cada dia mais caro. Não sei onde vai parar. Já mudamos hábitos por conta disso. Estou tentando substituir os produtos mais caros por mais baratos, vir mais vezes ao supermercado para pegar promoções e boicotar as marcas mais caras, além de ir fazer compras em bairros mais distantes, onde os produtos costumam ser mais baratos do que na Zona Sul”, reforça. Ainda de acordo com a dentista, o hábito de almoçar ou jantar fora de casa também foi modificado. Ela afirma que há pouco tempo, o marido saía cedo para trabalhar e sempre almoçava na rua, mas que agora, ele volta para casa todos os dias para economizar. As saídas nos fins de semana também foram reduzidas e as reuniões com os amigos em casa estão mais comuns. “Acho que é mesmo uma mudança de cultura. Estamos aprendendo a economizar nas pequenas coisas, questões de cidadania como economia de água e energia, que não afetam só a gente. Já cortamos o supérfluo. Fica muito mais barato tomar um vinho e comer alguma coisa em casa do que frequentar um restaurante”, completa.
ALÉM DO TETO Roberto Piscitelli, professor de finanças públicas na Universidade de Brasília (Unb) acredita que ao longo do ano as projeções do mercado vão recuar, mas mesmo assim, ele aponta que o teto da meta (6,5%) do governo está descartado, e as projeções mais otimistas podem esperar uma alta no custo de vida ao término de 12 meses, próxima a 7,5%. Para Piscitelli o governo usou uma dose pesada demais no repasse para os consumidores dos custos da energia elétrica “O ônus poderia ter sido repassado aos poucos, com o governo absorvendo parte da defasagem para que o choque não fosse tão forte”, avalia. Segundo o especialista, pesa ainda para escurecer o cenário econômico, discussões acerca da legitimidade das eleições e ainda o efeito cambial.
O dólar que afeta a inflação e interfere também nos planos de férias da classe média brasileira, não encontra consenso entre especialistas. Para Piscitelli a moeda deve estabilizar próximo a R$ 3,50. Na opinião de Tharcísio de Souza, diretor do MBA da Faculdade Armando Álvares Penteado (Faap), o câmbio antes de recuar deve disparar para R$ 4 nos próximos 90 dias. “Acredito que a partir de 2016 a economia possa ter algum pequeno crescimento, mas nada parecido com o percentual de 7,5% ao ano. Considero positivo crescer menos e de uma forma mais equilibrada, sem voos de galinha”, avalia.
A expectativa dos analistas de bancos e corretoras ouvidos no levantamento feito pelo Banco Central que consiste no relatório Focus, prevê um ano de galope do dragão. Pela décima-segunda semana consecutiva, a mediana das estimativas do mercado financeiro para o IPCA deste ano foi elevada. Para esses profissionais, a alta esperada passou de 7,93% para 8,12%. Ainda na divulgação do Focus, a projeção da inflação de 2016 ficou em 5,61%. Nas previsões do BC, as pressões dos preços administrados, quer dizer, dos serviços públicos de energia e água, combustíveis, entre outros, ficará restrita ao primeiro trimestre, mas não parecer ser esta análise convincente para o setor privado e o consumidor que administra o orçamento familiar.
As sondagens de opinião aplicadas pela Fundação Getulio Vargas ainda não captaram pressões fortes do dólar. A instituição deve apurar no fim de abril como os custos com matérias-primas vêm se comportando na produção industrial. Segundo o coordenador de Sondagens Conjunturais do Ibre/FGV, Aloísio Campelo, o desenrolar do câmbio e o nível em que a moeda norte-americana se estabilizar serão determinantes nos repasses dos custos industriais aos preços. “Na medida em que o dólar vai subindo pode gerar uma pressão inevitável e as fábricas não poderão produzir abaixo dos custos. Aí sim, terão de reajustar seus preços, mas neste momento a indústria tem muita dificuldade porque o consumo das famílias está fraco”, afirma Campelo.
As indústrias de panificação e de massas planejam repassar em abril pelo menos parte do aumento do custo de produção provocado pela elevação do dólar, que encarece o trigo cotado no mercado internacional, e pelo avanço das tarifas de energia. As padarias estão trabalhando nas planilhas para definir o reajuste dos preços do pãozinho de sal e demais itens feitos à base de farinha de trigo, que é faturada nos moinhos com o acréscimo da alta recente da moeda norte-americana. O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Panificação e Confeitaria(Abip), José Batista de Oliveira, afirmou, ontem, que o repasse é inevitável, ante os impactos da expressiva variação do dólar, que avançou de R$ 2,60 em janeiro para R$ 3,30 na semana passada, e a energia que aquece os fornos 60% mais cara. “Os empresários do setor estão trabalhando nas planilhas para repassar o mínimo possível. O que a gente gostaria era de trabalhar para aumentar o consumo de pães, e não o contrário”, disse.
A farinha de trigo responde por um terço do custo de fabricação do pão e a energia representa 14% do total. José Batista de Oliveira diz que prefere não arriscar uma estimativa dos reajustes ao consumidor, tendo em vista que os cálculos estão sendo feitos, inclusive pela indústria de moagem do trigo. Os fabricantes de biscoitos e bolos industrializados cogitam repassar 8% de aumento, em média, devido às mesmas pressões de custos, admitiu recentemente o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Biscoitos, Massas Alimentícias, Pães e Bolos Industrializados (Abimapi), Cláudio Zanão.
A perspectiva de repassar as despesas maiores não é diferente em outros segmentos da indústria de transformação. O presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Paulo Pedrosa, diz que o repasse de custos tanto aos consumidores finais quanto a outras indústrias deixa as empresas vulneráveis frente a seus competidores estrangeiros, agora beneficiados pela queda dos preços do petróleo e do gás natural. “Nos casos em que o repasse para os preços é inevitável, a indústria tende a reduzir suas margens, o que pode implicar em prejuízos e redução de investimentos produtivos”, avalia Pedrosa.
SEM COMPENSAÇÕES Até mesmo a proteção representada pelo dólar mais alto a alguns segmentos da indústria nas exportações de seus produtos pode não ser suficiente para evitar aumento de preços, observa o gerente de economia e finanças da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Guilherme Veloso Leão. “A tendência natural é de redução das margens e de adoção de medidas para melhorar a produtividade, mas essa estratégia fica difícil devido à baixa produção”, afirma.
O Índice de Preços ao Produtor da indústria de transformação subiu 2,86% nos últimos 12 meses até janeiro, enquanto o indicador da inflação oficial do país – o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – evoluiu 7,70% em 12 meses até fevereiro, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A disparidade entre os dois indicadores é sinal de que a indústria não conseguiu descarregar o aumento dos custos aos preços, ou seja, novos reajustes deverão ser aplicados. A conta dos bares e restaurantes também não deve se esquivar da alta dos preços dos alimentos, da sazonalidade dos hortifrutigranjeiros, e do reajuste da folha. O presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes de Minas Gerais (Sindhorb-MG), Paulo César Pedrosa diz que apesar de não haver clima para repasse de preços, o segmento já está com as despesas potencialmente altas e terá que repassar preços ao consumidor. “Os custos das carnes e das bebidas estão crescendo de forma generalizada. Em julho teremos a data-base e o custo da mão de obra vai ser reajustado.”
Como a inflação é para todos, diante da pressão de custos a família da dentista Mônica de Carvalho Martins Marques, de 55 anos, com renda acima de R$ 20 mil, já sofre os efeitos da economia brasileira. Mônica conta que se assusta todas as vezes que vai ao supermercado e se depara com preços diferentes. “Está cada dia mais caro. Não sei onde vai parar. Já mudamos hábitos por conta disso. Estou tentando substituir os produtos mais caros por mais baratos, vir mais vezes ao supermercado para pegar promoções e boicotar as marcas mais caras, além de ir fazer compras em bairros mais distantes, onde os produtos costumam ser mais baratos do que na Zona Sul”, reforça. Ainda de acordo com a dentista, o hábito de almoçar ou jantar fora de casa também foi modificado. Ela afirma que há pouco tempo, o marido saía cedo para trabalhar e sempre almoçava na rua, mas que agora, ele volta para casa todos os dias para economizar. As saídas nos fins de semana também foram reduzidas e as reuniões com os amigos em casa estão mais comuns. “Acho que é mesmo uma mudança de cultura. Estamos aprendendo a economizar nas pequenas coisas, questões de cidadania como economia de água e energia, que não afetam só a gente. Já cortamos o supérfluo. Fica muito mais barato tomar um vinho e comer alguma coisa em casa do que frequentar um restaurante”, completa.
ALÉM DO TETO Roberto Piscitelli, professor de finanças públicas na Universidade de Brasília (Unb) acredita que ao longo do ano as projeções do mercado vão recuar, mas mesmo assim, ele aponta que o teto da meta (6,5%) do governo está descartado, e as projeções mais otimistas podem esperar uma alta no custo de vida ao término de 12 meses, próxima a 7,5%. Para Piscitelli o governo usou uma dose pesada demais no repasse para os consumidores dos custos da energia elétrica “O ônus poderia ter sido repassado aos poucos, com o governo absorvendo parte da defasagem para que o choque não fosse tão forte”, avalia. Segundo o especialista, pesa ainda para escurecer o cenário econômico, discussões acerca da legitimidade das eleições e ainda o efeito cambial.
O dólar que afeta a inflação e interfere também nos planos de férias da classe média brasileira, não encontra consenso entre especialistas. Para Piscitelli a moeda deve estabilizar próximo a R$ 3,50. Na opinião de Tharcísio de Souza, diretor do MBA da Faculdade Armando Álvares Penteado (Faap), o câmbio antes de recuar deve disparar para R$ 4 nos próximos 90 dias. “Acredito que a partir de 2016 a economia possa ter algum pequeno crescimento, mas nada parecido com o percentual de 7,5% ao ano. Considero positivo crescer menos e de uma forma mais equilibrada, sem voos de galinha”, avalia.
A expectativa dos analistas de bancos e corretoras ouvidos no levantamento feito pelo Banco Central que consiste no relatório Focus, prevê um ano de galope do dragão. Pela décima-segunda semana consecutiva, a mediana das estimativas do mercado financeiro para o IPCA deste ano foi elevada. Para esses profissionais, a alta esperada passou de 7,93% para 8,12%. Ainda na divulgação do Focus, a projeção da inflação de 2016 ficou em 5,61%. Nas previsões do BC, as pressões dos preços administrados, quer dizer, dos serviços públicos de energia e água, combustíveis, entre outros, ficará restrita ao primeiro trimestre, mas não parecer ser esta análise convincente para o setor privado e o consumidor que administra o orçamento familiar.
As sondagens de opinião aplicadas pela Fundação Getulio Vargas ainda não captaram pressões fortes do dólar. A instituição deve apurar no fim de abril como os custos com matérias-primas vêm se comportando na produção industrial. Segundo o coordenador de Sondagens Conjunturais do Ibre/FGV, Aloísio Campelo, o desenrolar do câmbio e o nível em que a moeda norte-americana se estabilizar serão determinantes nos repasses dos custos industriais aos preços. “Na medida em que o dólar vai subindo pode gerar uma pressão inevitável e as fábricas não poderão produzir abaixo dos custos. Aí sim, terão de reajustar seus preços, mas neste momento a indústria tem muita dificuldade porque o consumo das famílias está fraco”, afirma Campelo.
Fonte: Estado de Minas