Notícias

Material de limpeza dá um banho na crise

Material de limpeza dá um banho na crise Moradora de Icaraí, em Niterói, a bióloga Mariana Duque reduziu a frequência da empregada em casa de três para uma vez na semana. A mudança veio no início do ano, quando ela deixou o emprego para investir num novo negócio. Para isso, a família se apertou e passou a dividir os cuidados com a limpeza da casa: — Compro bons produtos, as melhores marcas, mais práticas e econômicas. Também compramos um aspirador de pó, que ajuda muito. E gostaria de ter uma lava-louça — conta ela, que inclui os filhos de 7 e 10 anos na rotina de cuidados com o lar. — Aprendi que é uma questão de organização. Já me preparo para voltar a trabalhar e vamos seguir nesse esquema.

Mariana traduz uma mudança de hábitos da classe média brasileira que permitiu ao setor de material de limpeza dar um banho na recessão. As famílias têm dispensado domésticas, mais mulheres estão trabalhando para ajudar no orçamento e, com isso, as vendas do segmento crescem, afirmam pesquisa de consumo e especialistas. É a própria crise econômica reforçando essa nova tendência de consumo.

Dados da Kantar Worldpanel também mostram que a fatia de domicílios de classe AB com empregada mensalista caiu de 4,8%, em junho de 2012, para 2,9%, em igual mês deste ano.

— A classe AB é mais preocupada com a situação econômica. É onde há redução no número de lares com empregada, movimento que teve início em 2012, com o aumento do salário das domésticas — explica Marina de Albuquerque, gerente de contas da Kantar. — Com o aumento de preço dos produtos e as pessoas com menos tempo para limpar a casa, cresce a demanda por soluções práticas e eficientes.

O Brasil já é o quarto maior mercado para produtos de limpeza no mundo, atrás de EUA, China e Japão. Entre 2009 e 2014, as vendas cresceram 17,3%, totalizando US$ 7,8 bilhões por ano, segundo a Euromonitor International. A previsão é de expansão de 16,6% até 2019. Nos últimos cinco anos, os produtos para limpeza da cozinha deram salto de 117,6% em vendas. Já os limpa-vasos, por exemplo, não aparecem no estudo 2009-2014 da Euromonitor. A estimativa para até 2019, contudo, é de alta de 35,2% nas vendas desse item.

A crise leva as pessoas a fazerem substituições na hora de comprar. Optam por embalagem menor, compram menos ou migram para item mais barato. Na prática, porém, isso se traduz em dois movimentos. Dá força ao segmento top, de marcas consolidadas. Na outra ponta, estimula a venda dos itens mais baratos.

— O perfil de consumo que mais cresce nos últimos anos é o do “econômico extravagante”. Para manter pequenos luxos, o consumidor economiza em categorias mais básicas. E faz escolhas mais conscientes em relação a custo e benefício — explica Adriano Araújo, diretor da Dunnhumby do Brasil.

A publicitária Mariana Fleury adotou essa estratégia: — Prefiro as melhores marcas. Como trabalho fora, busco praticidade — conta ela, que mora com o filho de 3 anos e, com o aperto no orçamento, dispensou a empregada. — Passei a usar a lava-louça, que só funcionava no fim de semana.

Não por acaso, a lava-louça é equipamento com alta de 45,6% em vendas ao ano desde 2009, segundo a Euromonitor. — A lava-louças é uma oportunidade a ser explorada, pois possui baixa penetração no Brasil (2%) — explica Roberta Donato, gerente- geral de marketing da Whirlpool para a América Latina, fabricante das marcas Brastemp e Consul.

Para a Unilever, líder no setor no país, a tendência das pessoas investirem em produtos de alta performance vai se acelerar: — Os consumidores estão assumindo a rotina de limpeza da casa e das roupas. Tem sido significativo o crescimento de produtos que entregam alta performance combinada com praticidade e conveniência — conta Juliana Carvalho, diretora de marketing de cuidados com a casa da Unilever, citando o Cif Desengordurante Ultra Rápido, que promete limpar sujeira pesada em dez segundos, e Omo Tira-Manchas, usado na lava-roupa.

Apostando em qualidade, produtos de marca própria de redes varejistas ganham espaço na cesta de limpeza. No primeiro semestre, os cem itens de maior venda da Qualitá, do Grupo Pão de Açúcar, registraram avanço de 10% sobre janeiro a junho de 2014. Na outra ponta, as marcas premium investem em inovação para fisgar o consumidor.

— Focamos em produtos que façam com que as pessoas percam menos tempo no trabalho, façam a limpeza de forma rápida e prática, como Vanish OxiAction, que tira manchas em 30 segundos, e o Harpic Cliq, gel adesivo para limpeza de vaso sanitário — conta Jiri Kulik, vice-presidente sênior para a América Latina e o Brasil da Reckitt Benckiser, segunda companhia no segmento de limpeza no Brasil.

Mesmo na crise, a balança entre tempo livre e custo do produto pode pender na direção da praticidade.

— O tempo para cuidar dos afazeres domésticos pede soluções que tragam praticidade, independentemente do preço. O consumidor mais jovem trabalha fora, tem filhos mais tarde e busca produtos convenientes e ecologicamente corretos — avalia Eduardo França, coordenador do MBA em Estratégias e Ciências do Consumo da ESPM Rio.

A Àkora Brasil, de venda direta de produtos sustentáveis em higiene e limpeza, está atenta a esse movimento e à demanda das classes B e C. Em cinco anos de mercado, tem mais de dois mil revendedores. O carro-chefe é o Ecomais, pano para limpeza de pisos e superfícies que utiliza apenas água. Há ainda a Ecobola, bola com cerâmica que substitui o uso do sabão na lava-roupa.

— Mapeamos produtos inovadores no mundo. Custam mais caro mas, no uso, trazem economia. E são sustentáveis. A demanda por itens amigos do meio ambiente é crescente — explica a sócia - diretora Márcia Toyoshima.

Fonte: O Globo